Novo texto para trabalho: Shopenhauer, Aforismos para Sabedoria de Vida

O texto para o trabalho final da disciplina pode ser baixado clicando  aqui, ou se preferir outra fonte, basta digitar no google: "Shopenhauer aforismos para sabedoria de vida", que muitas fontes estarão disponíveis. O texto deve ser lido até a página 18, onde se aborda "o que o homem é". Abaixo segue o link dos vídeos que passaremos em sala de aula e servirão de apoio. 



Textos complementares aula de Filosofia – EJA  Professor Alam

Texto 1:

“Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
 Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
 Mas porque a amo, e amo-a por isso,
 Porque quem ama nunca sabe o que ama
 Nem sabe por que ama, nem o que é amar ...
 Amar é a eterna inocência,
 E a única inocência não pensar...” (Alberto Caieiro, o Guadador de Rebanhos)

Texto 2:

Não basta abrir a janela
Para ver os campos e o rio.
Não é bastante não ser cego
Para ver as árvores e as flores.
É preciso também não ter filosofia nenhuma.
Com filosofia não há árvores: há idéias apenas.
Há só cada um de nós, como uma cave.
Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora;
E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse,
Que nunca é o que se vê quando se abre a janela. (Alberto Caieiro, Poemas Inconjuntos)

Texto 3:

XXVI
Mais que a existência
É um mistério o existir, o ser, o haver
Um ser, uma existência, um existir —
Um qualquer, que não este, por ser este —
Este é o problema que perturba mais.
O que é existir — não nós ou o mundo
Mas existir em si? (Fernando Pessoa, Primeiro Fausto)

Exercícios:  Com base em nossas aulas e nos textos responda:

1.       Existe alguma dirença na forma como dois primeiros poemas abordam o pensamento filosófico em relação ao terceiro?
2.       Existe alguma contradição nos dois primeiros poemas?
3.       O que é a Metafísica?

Link para baixar o livro de filosofia 1º e 2º anos

Cliquem aqui e obtenham o livro da filósofa Marilena Chauí. 

Epicuro e Felicidade




Após as descrições de Gilles Deleuze sobre as características do conceito (consistência, história complexidade) chegou a hora de ver um conceito filosófico de perto e perceber que realmente um conceito filosófico só é difícil enquanto ainda não entendemos qual o problema está envolvido. O problema com que os conceitos de Epicuro lidam é o problema que interessa a todos nós: como ser felizes? Todos os nossos atos buscam a felicidade, mas não sabemos o que procurar, se devemos acumular dinheiro para garantir a vida ou se devemos orientar nossas energias em outra direção. Epicuro tem algumas palavras esclarecedoras a esse respeito, observemo-las. O vídeo está dividido em três partes. Clique aqui para baixar um dos textos famosos de Epicuro ou aqui para ter acesso a uma coletânea de fragmentos. 
Segue abaixo, alguns trechos selecionados. 


Alguns dos desejos são naturais e necessários; outros são naturais e não necessários; outros nem naturais nem necessários, mas nascidos apenas de uma vã opinião.

*



Aqueles desejos que não trazem dor se não são satisfeitos não são necessários; o seu impulso pode ser facilmente posto de parte, quando é difícil obter a sua satisfação ou parecem trazer consigo algum prejuízo.

*

A imediata desaparição de uma grande dor é o que produz insuperável alegria: esta é a essência do bem, se o entendemos direito, e depois nos mantemos firmes e não giramos em vão falando do bem.

*

E como o prazer é o primeiro e inato bem, é igualmente por este motivo que não escolhemos qualquer prazer; antes, pomos de lado muitos prazeres quando, como resultado deles, sofremos maiores pesares; e igualmente preferimos muitas dores aos prazeres quando, depois de longamente havermos suportado as dores, gozamos de prazeres maiores. Por conseguinte, cada um dos prazeres possui por natureza um bem próprio, mas não deve escolher-se cada um deles; do mesmo modo, cada dor é um mal, mas nem sempre se deve evitá-las. Convém, então, valorizar todas as coisas de acordo com a medida e o critério dos benefícios e dos prejuízos, pois que, segundo as ocasiões, o bem nos produz o mal e, em troca, o mal, o bem.

*

Formula a seguinte interrogação a respeito de cada desejo: que me sucederá se se cumpre o que quer o meu desejo? Que me acontecerá se não se cumpre?

*

Então quem obedece à natureza e não às vãs opiniões, a si próprio se basta em todos os casos. Com efeito, para o que é suficiente por natureza, toda a aquisição é riqueza, mas, por comparação com o infinito dos desejos, até a maior riqueza é pobreza.

*

E consideramos um grande bem o bastar-se a si próprio, não com o fim de possuir sempre pouco, mas para nos contentarmos com pouco no caso em que não possuamos muito, legitimamente persuadidos de que desfrutam da abundância do modo mais agradável aqueles que menos necessidades têm, e que é fácil tudo o que a natureza quer e difícil o que é vaidade.

*

Não deves corromper o bem presente com o desejo daquilo que não tens; antes, deves considerar também que aquilo que agora possuis se encontrava no número dos teus desejos.

*

A vida do insensato é ingrata, encontra-se em constante agitação e está sempre dirigida para o futuro.

*

Recordemos que o futuro não é nosso nem de todo não nosso, para não termos de esperá-lo como se estivesse para chegar, nem nos desesperarmos como se em absoluto não estivesse para vir.

Não são os convites e as festas contínuas, nem a posse de meninos ou de mulheres, nem de peixes, nem de todas as outras coisas que pode oferecer uma suntuosa mesa, que tornam agradável a vida, mas sim o sóbrio raciocínio que procura as causas de toda a escolha e de toda a repulsa e põe de lado as opiniões que motivam que a maior perturbação se apodere dos espíritos. De todas estas coisas, o princípio e o maior bem é a prudência, da qual nascem todas as outras virtudes; ela nos ensina que não é possível viver agradavelmente sem sabedoria, beleza e justiça, nem possuir sabedoria, beleza e justiça sem doçura. As virtudes encontram-se por sua natureza ligadas à vida feliz, e a vida feliz é inseparável delas.

*

Não realizes na tua vida nada que, se for conhecido por teu próximo, te possa acarretar temor.

Os conceitos


Os conceitos são a criação específica da filosofia. Enquanto as artes criam afectus e perceptus, e a ciência cria funções, a filosofia cria conceitos. Elas se diferenciam enquanto atividade criadoras, mas existem ressonâncias nas suas criações: há casos de conceitos perpassados fortemente por afectus (como os conceitos da filosofia de Nietzsche) assim como há afectus perpassados de conceitualidade (como a poesia de Fernando Pessoa).  Pode-se dizer que atuando como centros de vibração de pensamento, os conceitos alcançam níveis afectivos e perceptivos, assim como a atuação dos afectus e perceptos - como centros de vibração de sensações - atingem os atos de pensamento.

Os conceitos filosóficos são complexos, formados por partes e componentes, assim como os afectus e perceptus são blocos de sensações e não sensações isoladas. São complexos de intuições e ideias, ou melhor dizendo, são compostos de atos de pensamento. Os afectus e percetos não são memórias individuais, assim como os conceitos não são as opiniões de cada um (a filosofia não se caracteriza pelo ter ou discutir opiniões, mas pela condensação de atos de pensamento em conceitos). 

Os conceitos remetem a problemas. De acordo com Deleuze, a filosofia, só é vista como abstrata, difícil e distante na medida em que não somos capazes de dizer qual problema um conceito tenta responder. Mas os problemas filosóficos não são qualquer problema, não podem ser respondidos com uma pesquisa empírica ou com uma “checagem” dos fatos. Se um problema pode ser respondido com uma pesquisa, num laboratório, ou com um simples apontar, então esse problema (geralmente) não interessa a filosofia. Pode-se dizer que é um problema pobre de conceitualidade. Talvez possa interessar as ciências, que os transformará em funções. Mas deve ser guardado que o sentido do conceito é o problema. Mas além de remeter a problemas os conceitos tem características:

(1) Os conceitos têm história. Todo conceito é feito com pedaços de outros conceitos que diziam respeito a outros problemas ou outros planos diferentes. As partes do conceito podem se tornar elas mesmas outros conceitos, com suas partes que também podem ser tomadas como conceitos, indefinidamente (as partes dos conceitos se ampliam em rede). Por exemplo, o conceito de Deus, tem como uma de suas partes, a ideia de Existência, mas se tomarmos  “Existência” como conceito encontraremos a ideia de Ser dentro deste novo conceito, como também encontramos a ideia de “Nada” e a de “Essência”. Mas cada uma delas pode assumir a função de conceito e tomar as outras como uma de suas partes (as partes de um conceito abrem-se em séries infinitas).

(2) os conceitos tem consistência porque estabelecem uma relação entre seus elementos, torna-os inseparáveis e articulados, faz passar algo entre eles. Um conceito é um “ponto de encontro” de suas partes, um ponto de condensação, de acúmulo (no conceito de Deus, se encontram a essência, o nada, a existência, a perfeição). Nas palavras do autor: um conceito define-se pela inseparabilidade de um número finito de componentes heterogêneos percorridos por um ponto em sobrevôo absoluto, à velocidade infinita”.

(3) O conceito é dinâmico, está em movimento, é formado por atos de pensamento, não por idéias prontas: O conceito não deixa de percorrer seus componentes de alto a baixo. O filósofo está sempre remanejando seus conceitos, percorrendo a avenida que torna suas partes vizinhas, mudando a localização das casas de acordo com as relações de simpatia e antipatia entre os vizinhos, abrindo novas avenidas, mudando o sentido das vias, tapando os buracos do asfalto. Os afectus e percepetus criam um ser de sensação, enquanto os conceitos criam um ser de pensamento, mas um ser de atos de pensamento em movimento, não de pensamentos prontos e já concebidos.

O filósofo impregna a consistência de seus conceitos de maneira intrínseca e necessária, ele é um personagem conceitual que auxilia na consistência, na liga entre as partes. Diferente do que acontece nas ciências, nelas, uma idéia leva o nome de seu autor (lei de Newton, diagrama de Pauling, coordenada cartesiana), mas o nome poderia ser outro, poderia ser qualquer um, enquanto que na filosofia assinatura do conceito dá um aspecto especial a ele. As idéias de Nietzsche não seriam o que são se não fossem amparadas pela personalidade do próprio Nietzsche, a sabedoria dos conceitos de Epicuro seria outra sem a coerência que a vida que ele  levou deu aos seus conceitos.   (texto Jorge Alam Pereira)
SEGUNDO TEXTO PARA ANÁLISE: 



Lembro-me bem do seu olhar.
Ele atravessa ainda a minha alma,
Como um risco de fogo na noite.
Lembro-me bem do seu olhar. O resto…
Sim o resto parece-se apenas com a vida.

Ontem, passei nas ruas como qualquer pessoa.
Olhei para as montras despreocupadamente
E não encontrei amigos com quem falar.
De repente vi que estava triste, mortalmente triste,
Tão triste que me pareceu que me seria impossível
Viver amanhã, não porque morresse ou me matasse,
Mas porque seria impossível viver amanhã e mais nada.

Fumo, sonho, recostado na poltrona. Dói-me viver como uma posição incómoda.
Deve haver ilhas para o sul das coisas
Onde sofrer seja uma coisa mais suave,
Onde viver custe menos ao pensamento,
E onde a gente possa fechar os olhos e adormecer ao sol
E acordar sem ter que pensar em responsabilidades sociais
Nem no dia do mês ou da semana que é hoje.

Abrigo no peito, como a um inimigo que temo ofender,
Um coração exageradamente espontâneo,
Que sente tudo o que eu sonho como se fosse real,
Que bate com o pé a melodia das canções que o meu pensamento canta,
Canções tristes, como as ruas estreitas quando chove.

Álvaro de Campos heterónimo de Fernando Pessoa






1.2. Responda as questões abaixo, se possível na forma de uma redação:

a. Na sua opinião o texto revela, descobre ou cria afectos e perceptos? Por quê?

b. Caso o texto seja perpassado de perceptos e afectos (conjuntos de percepções e sensações), descreva as suas impressões sobre ele, o que ele te fez pensar, ver ou sentir? (podem caprichar nessa parte). 

c. Qual dos métodos de criação foi usado para composição deste texto? Justifique sua resposta. 

d. Os afectos e perceptos são independentes da vida particular do autor? Sustentam-se sozinhos? Por quê?

Perceptos e Afectos, texto explicativo e exercícios


Perceptos e afectos

O que são os perceptos e afectos?

Blocos de percepções ou sensações que são criados por artistas, cineastas e escritores. Um artista não cria só um quadro ou uma música, ele cria perceptos e percepções a partir de sua criação. Os perceptos são como que descrições de situações imaginadas ou vividas pelos artistas e nos ajudam a ver o mundo de outra forma. Já os afectos são modos de sentir e existir que atuam sobre a vida daqueles que os observam. 

Qual a maior dificuldade em ver os afectos e perceptos?
 
Acreditar que tudo que o artista cria (livro, poema, quadro, escultura) é apenas aquilo que ele viveu, que sua obra é somente um diário ou um registro de sua biografia. Existem de fato muitas obras que realmente não passam da biografia dos seus autores (o livro de Bruna surfistinha sobre suas aventuras eróticas). Mas de acordo com Deleuze, como veremos, essas obras não passam no teste da independência.

Qual o perigo em nos focarmos demais na biografia?
 
Isso pode nos levar uma preocupação mais com ao criador do que com a criatura, a prestar mais atenção na cozinha do que no prato feito, a buscar fofocas e curiosidades sobre a vida dos criadores e achar que suas criações são meros reflexos de suas vidas conturbadas.  Os reality-shows e as revistas de fofocas chafurdam nessa sujeira a procura de assunto. 

Como saber se uma obra apresenta afectos e perceptos?

De acordo com Deleuze, um quadro (como a Mona Lisa) conserva um gesto (um sorriso misterioso) que já não depende de quem o efetuou (a verdadeira modelo já morreu há tempos). Assim como uma música triste conserva uma tristeza que já não é mais sentida pelo seu compositor; assim como um livro descreve uma paisagem (física ou emocional) que já não depende de quem a viveu pra existir (basta voltar a página e tudo se conserva lá). A arte libera os afectos de nossas vidas particulares e os conserva.  Isso porque ao criar o artista faz com que sentimentos se tornem afectos e aquilo que as pessoas viram se torne percepto (a função do artista é arrancar perceptos das percepções, afectos das emoções, é por isso que afectos e perceptos transbordam qualquer vivido). 
O livro de Bruna Surfistinha, por exemplo, dependa da sua autora pra existir, sem ela, o livro não se sustenta sozinho, quando ela morrer, ou talvez, bem antes disso, o livro já não atraia mais o menor interesse. É pobre de afectos e perceptos, uma obra sem solidez. Ao contrário disso, não precisamos saber como viveu ou quem foram Kafka ou Dostoievsky, mas seus livros contam histórias que vão além de suas vidas privadas e fazem com que nos tornemos parte de sua imaginação.

Como os afectos e perceptos criados nos fazem ver outras coisas, viver outras coisas?

Diz Deleuze: “Há páginas de Tolstoi que descrevem o que um pintor mal saberia descrever. Ou páginas de Tchekov que, de outra maneira, descrevem o calor da estepe. Há um grande complexo de sensações, pois há sensações visuais, auditivas e quase gustativas. Alguma coisa entra na boca”. Como acontece isso? De certa forma, um percepto torce os nervos e faz perceber o que de fato não está lá. Os afectos são devires, isto é, transformações, porque operam modificações na nossa sensibilidade, visão, opiniões. Pergunta-se o autor: que estranhas transformações operam em nos as músicas, com suas paisagens melódicas, seus personagens rítmicos? Que terror invade a cabeça de Van Gogh, tomada num devir girassol?

Por que os artistas criam?
 
Porque viram na vida algo de grande demais, intolerável demais, algo que excede suas forças. Suas obras são tentativas de liberar a vida onde ela se encontra aprisionada, são de certa forma, atletas da percepção ou da sensação, sentiram ou viram algo forte demais para qualquer um. A vida cria zonas de intensidade impossíveis que os verdadeiros criadores ousam atravessar. A vida cotidiana toma formas previsíveis que oprimem outras formas e possibilidades de existir, os afectos dos criadores ampliam as possiblidades, criam sensações e sentimentos que ainda não existem ou que não podem existir na forma e na intensidade que se apresentam, seja porque não somos capazes, seja porque o mundo os julga errados e proibidos.  O artista acrescenta novas variedades ao mundo, novas cores a cor, novos sons a sonoridade. O artista é mostrador, criador e inventor de afectos. Os artistas tornam sensíveis as forças insensíveis que povoam o mundo, tornam perceptíveis estados e situações ainda não perceptíveis ou já não perceptíveis por nós. O músico procura nos fazer ouvir o que até então não se pode ouvir, o que está no limite entre o ruído e o silêncio.

O que os artistas fazem com as sensações ou percepções para transformá-las em afectos e perceptos independentes?

Os métodos são variados e mudam de artista pra artista, é que dá um estilo diferente a cada um, mas em geral os artistas trabalham sobre as percepções. Um dos métodos é a vibração: o artista faz vibrar uma sensação ou percepção (numa música, por exemplo, um refrão forte é repetido várias vezes,). Outro é a saturação: o artista retira da sensação tudo o que é acessório, isola a sensação, examina e a deixa envelhecer e estancar. Outro é o enlace: misturar ou juntar uma sensação com sua variável oposta: muitas músicas trabalham o casamento do amor e do ódio, do ciúme e da indiferença. Há ainda o recuo: ver a sensação de longe, através de personagens criados. Há ainda a divisão (quando duas emoções complexas que andam juntas são separadas). Há a distensão: quando uma sensação é transposta pra outras situações ou pessoas diferentes da original. Existem muitos métodos, grandes artistas procuram inventar sua maneira de saturar as percepções e sensações, procuram inventar sua linguagem. Os escritores procuram sua forma particular de escrever, procuram criar uma língua nova dentro da língua falada. Dentro do português, temos a linguagem de Machado de Assis, dentro do espanhol, a de Pablo Neruda. O escritor procura fazer sua língua gaguejar, dizer algo de forma inédita pra exprimir ou instaurar seus afectos e perceptos, ele procura falar uma língua estrangeira dentro da própria língua.  Manuel de Barros tenta fazer entrar sons e cores, cheiros e sabores nas pedras, nas árvores, nos bichos, em toda natureza. O objetivo é fazer a língua gaguejar, tremer, cantar ou até gritar. 

Qual o resultado da criação dos perceptos?
Os perceptos e afectos criados permitem aberturas, vibrações e enlaces entre os seres humanos, são pacotes de transformações em desenvolvimento. Permitem novos padrões de relações entre as pessoas.  Os perceptos, junto com os afectos e os conceitos, são formas de resistir à banalidade da vida.

Exercícios: 

1.      Leia o Texto abaixo:

1.1   Aquele bote, salva vidas

Aquele bote salva-vidas de um barco mercante que conduzia farinha de Valdívia até o norte, naufragou não se sabe onde. As ondas o jogaram contra a costa e agora repousa no pomar de minha casa, como um animal doce e familiar.
Como recordações que apesar do tempo guardam sua marca inexpressável nas esquinas do coração, ele conserva ainda algas marinhas e diminutas, liquens de águas profundas, esta flora verde e minúscula que decora as raízes dos barcos.  E eu creio ainda ver a marca desesperada dos náufragos, daqueles que na angústia final se agarraram a esta embarcação marinha enquanto a imensa tempestade os perseguia.
Quando o sol ainda não se escondeu, subo neste bote náufrago, abandonado entre as ervas do pomar. Sempre levo um livro que nunca chego a abrir. Estendo meu casaco no banco e estendido sobre ele, vejo o céu infinitamente azul.
Velhas recordações submergidas pelas águas do tempo me assaltam. Sempre, nos ermos da saudade, me assombram esses salteadores indefiníveis. Sempre nos ermos da saudade sinto estrangeira minha alma.  Ruídos inesperados, múrmuros de vozes desconhecidas, cantos oprimidos e novos cantos vencedores, uma música estranha e irrefreável se quebra sobre meu coração, como o vento sobre a selva.
Mulher, nestes momentos te amo sem te amar. Em ti não penso porque em nada se detém meu pensamento. Como um pássaro bêbado, como uma flecha perdida, ele atravessa sem destino até perder-se na obscura distância.
Eu mesmo não me lembro: como poderia me lembrar?
Mas o teu amor descansa mais adentro e bem mais além de mim mesmo. Taça maravilhada que trago até meus lábios, o vinho mais doce, taça de amor. Não preciso me lembrar de ti. Como uma letra gravada profundamente, basta fazer voar a poeira impalpável para te ver. Não penso em ti, mas abandonado a todas as forças do meu coração, a ti também me abandono e me entrego, oh amor que sustenta meus sonhos tumultuosos, como a terra do fundo do mar sustenta as desamparadas correntes e as marés que não se pode conter. 
Pablo Neruda, Tradução: Jorge Alam Pereira dos Santos. 

1.2. Responda as questões abaixo, se possível na forma de uma redação:

a. Na sua opinião o texto revela, descobre ou cria afectos e perceptos? Por quê?

b. Caso o texto seja perpassado de perceptos e afectos (conjuntos de percepções e sensações), descreva as suas impressões sobre ele, o que ele te fez pensar, ver ou sentir?

c. Qual dos métodos de criação foi usado para composição deste texto?

d. Os afectos e perceptos são independentes da vida particular do autor? Sustentam-se sozinhos? Por quê?